Quais as contribuições das turbulências sociais?
As recentes cenas de guerra civil registradas no Egito contra o ditador Hosni Mubarak provocam reflexões. Turbulências econômicas, sociais e políticas podem ocasionar rupturas que possibilitam transformações nas estruturas diversas da sociedade. Transformações estas que podem fazer com que uma ordem venha a surgir ou uma outra retorne, seja através de movimentos da sociedade civil ou ações governamentais.
No Brasil, o comício das Diretas Já, em 1984, possibilitou, sem grande retaliação, a ruptura com uma ordem estabelecida. Não se observou, em meados de década de 80, por exemplo, a radicalização dos militares em virtude do histórico evento ocorrido na Praça da Sé em São Paulo. Ao contrário, as Diretas Já e a eleição de Tancredo Neves pelo Congresso Nacional representaram o ponto inicial do estabelecimento da democracia brasileira.
Após a redemocratização, constatam-se na trajetória histórica brasileira algumas rupturas econômicas e sociais institucionalizadas. O Plano Real possibilitou o fim da inflação, a estabilidade da moeda, a recuperação da renda dos brasileiros e a diminuição da desigualdade social. As privatizações permitiram a universalização de serviços básicos, como a telefonia. A ampliação do Programa Bolsa Família fez com que cerca de 12 milhões de famílias adquirissem uma renda mensal mínima. A expansão das instituições de Ensino Superior privadas e o Programa Universidade para Todos (Prouni) possibilitaram a milhões de brasileiros adquirir formação universitária.
O Plano Real e as privatizações foram medidas do presidente Fernando Henrique Cardoso. Ao assumir, o presidente Lula manteve os pilares básicos da política econômica do seu antecessor e tomou atitudes que vieram contribuir para as transformações socioeconômicas no Brasil. Dilma Roussef, por sua vez, até o instante, mostra que dará continuidade às boas ações e às positivas heranças dos seus antecessores.
As mudanças ocorridas no Brasil, propiciadas por medidas advindas de diversos atores, não foram provocadas por fortes manifestações sociais. Aqui e ali, de modo benéfico, movimentos e entidades civis tornaram públicas suas opiniões clamando por atitudes governamentais. Contudo, em nenhum momento, protestos de forte intensidade, de modo semelhante ao que se observa neste instante no Egito, ocorreram.
A sociedade brasileira, em razão de diversos motivos, os quais encontram explicação teórica na cultura política e na transformação que as instituições sofreram nestes últimos anos, mostra para diversos países que é possível romper com uma ordem anterior, sem perigo de algum tipo de retrocesso político, social e econômico.
Espera-se que as turbulências nos países árabes não acarretem em retrocessos e mais violência. A expectativa é que as manifestações registradas por lá possibilitem a queda de ditaduras, o enfraquecimento do radicalismo religioso e o desenvolvimento socioeconômico, para a consolidação de democracias onde, como no Brasil, o Estado, com seus representantes do povo, possa ser o protagonista das transformações latentes, sem sangue e sem lágrimas.