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Nasceu em 21 de março de 1964, em uma pequena cidade do sertão da Paraíba. Aos cinco anos, seus pais se mudam para Mato Grosso e, depois, para Rondônia.(...)
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Faculdades “não recomendam”

Neste ano, o Brasil comemora 180 anos de criação dos seus primeiros cursos jurídicos. Um aniversário para ser celebrado, especialmente pelos pernambucanos.

Foi na terra de Joaquim Nabuco, mais precisamente na cidade de Olinda, que se instalou uma das primeiras faculdades de direito do País, privilégio compartilhado apenas com o Estado de São Paulo. Apesar de toda essa tradição na área jurídica, perpetuada nos anos subseqüentes pelo surgimento de outras instituições de ensino, parece ter sido ignorada em avaliação recém-divulgada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Pernambuco tem hoje 24 cursos de direito, mas apenas um recebeu daquele conselho o selo de qualidade OAB Recomenda correspondente ao último triênio – o da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Ficaram de fora cursos considerados tradicionais, com qualidade garantida por professores renomados e infra-estrutura exemplar. Em todo o País, somente 87 dos 1.017 cursos jurídicos de graduação receberam a chancela. Segundo a Ordem, dos 322 avaliados, esses foram os que obtiveram o “melhor índice de qualidade”. Uma justificativa, no mínimo, questionável.

Perante a imprensa, o próprio presidente da Secção Pernambuco da OAB, Jayme Asfora, mostrou-se surpreso com a exclusão de alguns cursos jurídicos em funcionamento no Estado, propondo, inclusive, “a revisão de conceitos utilizados na avaliação”.

A postura do representante estadual da OAB, que não elimina a possibilidade de criação de um selo estadual de qualidade para avaliar o ensino jurídico em nosso Estado, só ratifica aquilo que é público e notório: a necessidade de uma discussão mais ampla acerca dos critérios para recomendação dos cursos. Indo mais além, cabe, ainda, analisar a própria validade do selo OAB Recomenda no atual contexto.

Para conferir a um curso de direito o carimbo de “recomendado”, a OAB utilizou como parâmetros a performance dos alunos nas avaliações do Exame Nacional de Desempenho do Estudante (Enade), antigo Provão, e no Exame de Ordem. É importante ressaltar que o Enade, analisado isoladamente na avaliação, integra apenas uma das etapas do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (Sinaes), instituído por lei pelo Ministério da Educação (MEC). Criado para ser o instrumento oficial de mensuração da qualidade do ensino superior, o sistema integra, ainda, a avaliação das instituições e dos cursos.

O índice de aprovação no Exame de Ordem, outro item considerado para a concessão do selo, também não avalia corretamente a qualidade do ensino jurídico. Com nível de exigência que extrapola a proposta curricular das graduações de direito, pois despreza matérias humanísticas, filosóficas e sociológicas, esse teste, condição para o exercício profissional, serve como mais um instrumento de reserva de mercado. Sem uma explicação convincente sobre os critérios de exclusão da totalidade dos cursos privados pernambucanos da lista da OAB, como classificar os advogados, juízes, promotores e procuradores graduados nos cursos jurídicos “não-recomendados”?

Há também outros fatores que põem em xeque a própria legitimidade da OAB nesse processo específico. Enquanto órgão de classe, compete à entidade intervir, unicamente, sobre questões referentes ao exercício da profissão, fase que se inicia apenas com a conclusão da formação superior. Quanto ao controle sobre a qualidade das graduações, inclusive as jurídicas, esse cabe apenas ao MEC. Ao se auto-instituir avaliadora dos cursos de direito, portanto, a entidade envereda por uma área de atuação que, constitucionalmente, não lhe corresponde.

Pelo menos por enquanto, a divulgação da lista dos cursos recomendados pela OAB não interfere, legalmente, no funcionamento das graduações, embora essa seja pretensão da entidade. Que assim continue, pelo desenvolvimento do ensino superior. Mas os efeitos desse ato poderão repercutir negativamente entre os que estudam nas faculdades cujos cursos de direito não receberam o selo, tendo em vista o caráter discriminatório da medida. Sob a égide de guardiã da qualidade do ensino jurídico brasileiro, a OAB termina por fazer, ao contrário, um desserviço ao ensino superior. Que a sociedade permaneça atenta a essas contradições. O que nos consola é que dos 1.017 cursos existentes no País, apenas 322 foram avaliados. Ou seja, os cursos que ainda não formaram turma, maioria no nosso Estado, não passaram por esse crivo.

Janguiê Diniz é doutor em direito e presidente da Abrafi.

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