Perfil

Nasceu em 21 de março de 1964, em uma pequena cidade do sertão da Paraíba. Aos cinco anos, seus pais se mudam para Mato Grosso e, depois, para Rondônia.(...)
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Histórico

Discurso do título de cidadão natalense

Senhores vereadores, minhas senhoras e senhores:
Encontro-me, nesta belíssima cidade, para que ela, como dizem, na sua imensa sabedoria, os matutos dos sertões nordestinos, “me arreçeba”, como mais um dos seus cidadãos. “Me arreçeba” e me integre à Fortaleza dos Reis Magos, cuja construção se iniciou em janeiro de 1598 – dia dos Reis Magos. “Me arreçeba” e me integre a essa Fortaleza que, em 1633 e num cruel/combate, foi tomada pelos holandeses, que passaram a chamá-la de Castelo Keulen, momento em que a cidade foi rebatizada de Nova Amsterdã. Em 1654, ela retorna ao domínio português. Me “arreçeba”, cidade de Natal, fundada no dia 25 de dezembro de 1599.

Fundada em 1599, às margens do Rio Potenji, Natal é um dos quatro pontos mais estratégicos do mundo e abriga três das sete maravilhas do Rio Grande do Norte: a Fortaleza dos Reis Magos, o Frasqueirão e o Morro do Careca. E, também, foi aqui, que em 24 de Janeiro de 1943, aconteceu o encontro histórico entre os presidentes Getúlio Vargas e Franklin Roosevelt. Natal já ganhou o mundo, é o portal de entrada das Américas, o ponto mais próximo da Europa e África. Uma cidade moderna e alegre, de um povo acolhedor sem igual.

Foi nesta belíssima e cultural cidade que instalamos, em 2008, a Faculdade Maurício de Nassau. Nossa proposta era oferecer muito mais que educação superior. Queríamos promover um trabalho sócio-educacional. E que orgulho eu tenho dos nossos alunos, colaboradores e parceiros que têm, brilhantemente, desenvolvido tais atividades com muito empenho e dedicação. Tudo em prol do contínuo desenvolvimento de Natal.

Natal, a cidade do sol, das grandes dunas de areia. Natal de Augusto Severo, o Mártir da Tecnologia Aeronáutica, abolicionista, líder político, parlamentar e inventor dos balões semi-dirigidos. Natal é muito mais que suas belas praias e paisagens, seus monumentos históricos que entretêm e deslumbram seus turistas e moradores.

E hoje, por iniciativa da vereadora Eudiane Macedo, AQUI PRESENTE, E COM A CONCORDÂNCIA DE TODOS OS DEMAIS VEREADORES E DO EXCELENTÍSSIMO PRESIDENTE DA CASA POPULAR, Albert Dickson, nesta solenidade de abertura do V Congresso Nacional de Ciências Criminais, recebo a relevante honraria que me naturaliza para sempre COM O NOBRE TÍTULO DE CIDADÃO NATALENSE.

Minha prezada Eudiane Macedo, a vereadora não pode mensurar a alegria que tenho em receber este Título, nem imaginar o orgulho em possuí-lo. Em uma das minhas conversas com Deus, agradeci pela minha vida e por tudo que me tem feito, pela minha saúde e por meus amigos e familiares. Mas, hoje, agradeci por, a partir de agora, ter o privilégio de dizer que sou, de fato e de direito Cidadão Natalense.

Senhoras e senhores.

Como seria impossível registrar os momentos historicamente relevantes e as grandes figuras – intelectuais, políticas e artísticas – desta cidade; como seria também impossível transferir para o papel a carga de emoções, a gratidão e a imensa responsabilidade que resultam deste ato de pertencimento, preferi me envolver, como num folheto de cordel – daqueles contados seguindo as letras do alfabeto – com os mitos, símbolos, liturgias, cantares e dizeres do povo brasileiro escolhidos/recolhidos, dentre aqueles que estão registrados no Dicionário do Folclore Brasileiro, escrito por um filho desta cidade, desta terra, por um grande brasileiro chamado Luiz da Câmara Cascudo.

Começo pelo ADÁGIO, que “são as mais aprovadas sentenças que a experiência achou nas ações humanas, ditas em breves e elegantes palavras”… “uma das formas clássicas da sabedoria, espécie de condensação de experiências, malícia, ironia e sátira, em conceitos breves”.

“Tempo é remédio.” Que adágio maravilhoso! Como poderia eu prever um momento tão importante como este, um momento tão importante para minha vida! Um remédio, um bálsamo, para minha alma, para o meu coração!
Sou um matuto paraibano. Nasci em Santana dos Garrotes, lá no Sertão do Piancó. Andei mais do que “notícia ruim”, como dizia um vaqueiro da minha terra, até aportar no Recife, cidade que me acolheu, também me naturalizou e que me permitiu ser o que eu sou hoje.

Estudando e me submetendo a concursos públicos rigorosos – de provas e de títulos -, tornei-me Juiz do Trabalho; em seguida, membro do Ministério Público do Trabalho; depois, professor da tradicional Faculdade de Direito do Recife – UFPE.

Seguindo/sempre este itinerário, procurei também seguir/simultaneamente a vida acadêmica e me tornei, ainda por concurso público, mestre e doutor em Direito, pela tradicional Faculdade de Direito do Recife da UFPE.
Mas, em meio a toda essa efervescência, havia algo que insistia em fazer e que precisava ser despertado/materializado. Hoje, tenho plena consciência deste outro “pedaço de mim.” Um fazedor de empreendimento, um fazedor de cultura. Comecei, pelejando, com uma instituição pequena, chamada Bureau Jurídico que, depois, foi se juntar a Faculdade Maurício de Nassau, hoje, Grupo Ser Educacional.

Agora, se notabilizam por oferecer um ensino de qualidade, tendo como objetivo permitir aos alunos uma aprendizagem centrada num conhecimento crítico/reflexível. Persegue o primado da educação, que não se limita a reproduzir conhecimentos, mas permite a aquisição de conhecimentos e está respaldado numa filosofia institucional que privilegia a excelência do seu corpo docente e um aparelho organizacional que prima pelo respeito à dignidade do trabalho.

Bendito seja, pois, este momento, porque bendito “significa canto religioso com que são acompanhadas as procissões e, outrora, as visitas de Santíssimo. Denomina o gênero, o uso da palavra bendito, iniciando o canto uníssono.” O canto uníssono pelo qual inicio meus agradecimentos pela honraria recebida. Bendito seja Deus, bendita seja esta cidade, bendito seja o seu povo, a sua arte, a sua cultura, bendito seja este meu pertencimento, que procurarei honrar, dignificar e exaltar!

Cântico que me faz lembrar uma manifestação artística tão presente na cultura popular nordestina a chegança. Em termos de sincretismo religioso, poder-se-ia invocar, nesta hora, uma chegança, um auto popular de origem portuguesa, tal como se instituíram aqui, nos idos de 1926, no Bairro Rocas. Ou, um adágio, um bendito… uma chegança, seguida de um banquete. Mas, para iniciar, simbolicamente, um banquete, um dabucuri ou banquete, festa de convite, dada de tribo a tribo, em sinal de amizade e boa vizinhança.”

Quem sabe, reunir, como reunia Câmara Cascudo, em sua residência, famosos violeiros/cantadores/improvisadores; falar dos REPENTES, das RABECAS, que se espalham, ainda hoje, sertão adentro, ou, como diria o cego Sinfônio Pedro Martins:

“Esta minha rabequinha
É meus pés e minhas mãos,
Minha foice e meu machado,
É meu mio e meu feijão,
É minha planta de fumo
Minha safra de algodão!”.

Senhores e senhoras parlamentares, minhas senhoras e meus senhores:

Daqui de onde estou, desde a minha infância, dos meus “relembramentos” de menino pobre, lá do sertão da Paraíba, posso ver/”claramente visto” a “VÉSTIA: “roupa encourada do vaqueiro sertanejo. Gibão, peitoral, perneiras, chapéu com barbicacho e quantes (“as luvas”). Ou, como diria Euclides da Cunha, uma armadura, “envolto de gibão de couro curtido, de bode ou de faqueta; apertado no colete também de couro; calçando as perneiras, de couro curtido ainda, muito justas, cosidas às pernas e subindo até às virilhas, articuladas em joelheiras de sola; e resguardados os pés e as mãos pelas luvas e guarda-pés de pele de veado “é como a forma grosseira de um campeador medieval, desgarrado em nosso templo”.

Talvez por ter nascido no nordeste brasileiro, nas lonjuras do sertão paraibano, tenha herdado, como vocês, esta visão cosmopolita, multifacetada, rítmica que representa a diversidade/uniformidade da nossa raça, da nossa cultura e que resulta da confluência de tantas raças e foi capaz de superar as possíveis contradições entre um modelo racional ilustrado e um modelo simbólico-dramático.

Lendo Luiz de Câmara Cascudo, pude entender melhor esta capacidade nordestina de viver e de superar desafios. E mais, pesquisando as obras deste que foi o maior folclorista brasileiro, nascido aqui, no dia 30 de dezembro de 1898, pude constatar também a complexidade e a uniformidade da cultura brasileira.

Procurei seguir, na ordem alfabética, o seu famoso Dicionário do Folclore Brasileiro, e pude extrair de fragmentos, passagens, falares, danças, folguedos, e cantares de várias regiões do país ali registradas. Uma maneira de, simbolicamente, homenagear todos os grandes intelectuais, pensadores, políticos e artistas desta cidade.

É que, para Câmara Cascudo, “o estudo dos seres humanos como criaturas de sociedade, e como surgiu, mantém-se, modifica-se a mecânica da convivência, é justamente a única e real finalidade da Antropologia, da Etnografia, do Folclore e das outras ciências do Homem…. Assim, de mão ao peito, informo que encontrei no povo do Brasil o material deste DICIONÁRIO e todas as coisas aqui registradas participam indissoluvelmente da existência normal do homem brasileiro.”

Não poderia haver contribuição mais notável para a cultura do nosso país, aquela que foi doada por alguém que o fez pensando da seguinte maneira: “se não nos é possível atinar para que vivemos, todo o esforço consciente é tentar sentir o como viveram e vivem em nós as culturas interdependentes e sucessivas, de que somos portadores, intérpretes, agentes e reagentes no tempo e no espaço.”

Que coisa linda: “sentir como viveram e vivem, EM NÓS, as culturas interdependentes e sucessivas de que somos portadores.”

Minhas senhoras e meus senhores, receber o título de cidadão desta bela cidade e na abertura deste congresso, significa incorporar, em mim e para sempre, as culturas interdependentes e sucessivas que nos unem e nos fazem alegres e felizes.

Particularmente, sinto-me tão feliz como uma “Manhecença”, tal como retratada por Jorge Fernandes – um dos precursores da poesia moderna do Brasil, em que a poesia de Natal, a partir de sua obra, apresenta momentos culturais da maior plenitude. Em Manhecença, ele diz:

O dia nasce grunindo pelos bicos
Dos urumarais…
Dos azulões… da asa branca…
Mama o leite quente que chia nas cuias espumando…
Os chocalhos repicam na alegria do chouto das vacas…
As janels das serras estão todas enfeitadas
De cipó florado…
E o coên! coên! do dia novo —
Vai subindo nas asas peneirantes dos carcarás…
Correndo os campos no mugido do gado…
No — mên — fanhoso dos bezerros…
Nas carreiras da cutias… no zunzum de asas dos besouros,
das abelhas… nos pinotes dos cabritos…
Nos trotes fortes e luzidos dos poltros…
E todo ensanguentado do vermelhão das barras
Leva o primeiro banho nos açudes
E é embrulhado na toalha quente do sol
E vai mudando a primeira passada pelos
Campos todo forrado de capim panasco..

A manhecença da cidade do Sol/das estrelas brilhantes, da cidade do Natal, das Noites de Natal, das Noites de Festa. “NATAL é a maior festa popular do Brasil, determinando um verdadeiro ciclo, com bailados, autos tradicionais, bailes. Alimentos típicos, reuniões, etc. De meados de dezembro, até Dia de Reis, 6 de janeiro, uma série de festas ocorre por todo o Brasil, especialmente pelo interior, onde a tradição é mais viva e sensível. O bumba-meu-boi, boi-calemba, cheganças, marujadas ou fandango, pastoris com as velhas lapinhas de outrora, congadas ou congos, reisados estão nos dias prestigiosos. Para aguardar-se a missa do galo, à meia-noite, há todos esses divertimentos, públicos, nas festas particulares ou nas sociedades. A denominação portuguesa de noite de festa persiste no Brasil, onde dezembro é denominado mês de festa. Dia de Festa, Noite de Festa é o dia, a noite de Natal.”

Por fim meus caros,

Uma cidade não poderia nascer/amanhecer/desenvolver-se envolvida com mais simbolismos /sincretismos /alegrias/ alumbramentos e resistências do que esta. Permitam-me meus concidadãos, sentir como viveram e vivem, em mim, toda esta história fascinante; incorporar as culturas interdependentes e sucessivas que formam o itinerário histórico deste povo e desta gente. A cidade de um menino, o menino Jesus, como na quadrinha que vem dos nossos ancestrais:

“Oh, meu Menino Jesus,
A vossa capela cheira,
Cheira a cravos e a rosas,
E a flor de laranjeira”.

Cidade que tem ainda, no seu imaginário, as folias dos Santos Reis, em que se canta: “Viva aos três reis do Oriente/Viva à estrela guia/Viva à bonita união” que ora se inicia e me deixa feliz, emocionado, agradecido. Por isso e para finalizar, ratifico: tudo farei para honrá-la e dignificá-la.

Muito obrigado meus concidadãos e que Deus abençoe a todos.

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